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sábado, 10 de julho de 2010

Essência

Com o passar dos anos, tenho vindo a perceber que o facto de ter passado a infância no Ribatejo minifundiário é um dos factores que mais contribuiu para aquilo que sou. Como dizia o meu Avô "sou agarrado à vida", ou seja, à minha vida e "quem está, está! quem passa, passa!". Pouco ou nada do que actualmente faz falar as pessoas me interessa (noticias, modas, televisão, futebol, "calhandrices", coscuvilhices, o "social", politica, motas de água, carros, motas, Algarve).

A vantagem de viver no mundo rural é poder ocupar o cérebro com o canto e movimento dos pássaros, enquanto outros se dedicam a dar "opinião" repetindo o que ouviram no Jornal Nacional, na M80 ou na edição da tarde de Bola Branca.

Não percebem nada de Internet - excepção para pornografia e redes sociais onde dizem conhecer muitas gajas - mas acham que deve haver tecnologia no futebol. Dizem que detestam politica mas repetem o professor Marcelo. Estão a passar tantas dificuldades por causa da crise que este ano vêem-se obrigados a ir de férias para a Tunísia.

Defendem a existência de Golden Shares mas acham que o governo não devia ser accionista das empresas que privatiza. Consideram indispensável o consumo de produtos nacionais mas fumam LM, bebem heineken, lêem a Playboy, vestem Tommy Hilfiger, calçam Timberland e, para poupar, vão de férias para o norte de África.

Não são raras as vezes em que gostava de ser analfabeto para não ler o que se vai escrevendo nos rodapés dos noticiários, nos jornais, na declaração de IRS, nas contas por pagar, no extracto bancário, nas sms, nos emails reencaminhados, nos pacotes de açúcar, na dica da semana ou nas toneladas de publicidade que me chegam a casa todas as semanas.

Tenho a sensação que o mundo me passa ao lado, que o ignoro, desvalorizo e até desprezo. O que não está muito longe da verdade. Os meus olhos vêem um mundo diferente e o meu coração vibra com esse mundo feito de mulher, filhos, amigos, família, cão, cabra, tartaruga, peixes, galinhas, porcos, horta, matraquilhos, casa, cigarros e uma humanidade (literal) a que chamo planeta Analfabeto. Uma coisa posso garantir... nesse pequeno planeta de gente enorme, tudo é imperfeito, instável, contracorrente, dissidente, mas equilibrado e harmonioso.

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